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Saberes negros e a luta antirracista: reflexões no mês da Consciência Negra
O Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, é um marco para a luta antirracista e a valorização da cultura negra no Brasil. Com o intuito de promover reflexões sobre essa data, a Fadepe realizou no dia 19/11, em parceria com o Critt e a Diretoria de Ações Afirmativas (DIAAF) da UFJF, a mesa-redonda “Saberes Negros: Memórias e Transformações para Reexistir”, reunindo especialistas para debater os desafios e as conquistas do movimento negro.
O evento contou com a participação de Danielle Teles, Professora e Diretora de Ações Afirmativas da UFJF; Antônio Carlos Hora, Jornalista e Professor; e Marilda Simeão, Professora e Especialista em História da África. A troca de experiências reafirmou a importância de iniciativas que ampliam a conscientização sobre a luta antirracista e o papel dos saberes negros na transformação da sociedade.
O significado do mês da Consciência Negra
Para Danielle Teles, o 20 de Novembro não é apenas uma data comemorativa, mas um marco para reflexões e ações. “A data é de extrema importância para rompermos com os silenciamentos sobre a existência do racismo no Brasil e com o mito da democracia racial. Trata-se de uma data que revindica a memória de Zumbi e a luta de todo o povo negro em busca de liberdade e justiça social.”
Segundo ela, o feriado também provoca reflexões sobre os privilégios presentes em nossa sociedade: “O racismo estrutural, como parte da ‘normalidade’ da nossa sociedade, faz com que, no Dia da Consciência Negra, pessoas brancas estejam livres para aproveitar o dia para descanso, lazer, família, satisfação pessoal, posts na internet e outras tantas coisas… enquanto as pessoas negras trabalham para a garantia destes privilégios brancos.”
Marilda Simeão abordou o caráter reflexivo do Dia da Consciência Negra, apontando sua ligação com as desigualdades sociais. “É um dia de luta, pois se celebra a morte de um herói da resistência, Zumbi dos Palmares. A morte dele representa a morte de milhões de afrodescendentes que fizeram à força a travessia do Atlântico. Leva a sociedade a refletir sobre as desigualdades sociais e sobre qual é a importância de um estado democrático de direito.”
A luta pela mudança da realidade
Todos os participantes concordaram que a luta antirracista deve ir além de datas comemorativas. Antônio Carlos Hora, por exemplo, enfatizou a importância das ações no cotidiano: “Toda forma de luta é válida. Hoje discute-se muito dentro do movimento negro e das mobilizações em prol da negritude a importância de termos referências negras. Mas essa importância não pode ficar circunscrita ao universo das famílias negras. Também tem que estar presente em famílias brancas, porque, se eu quisesse criar um filho antirracista, teria que trabalhar o imaginário dele, mostrando que existem reis, rainhas e heróis negros tão lindos quanto ele.”
Danielle explica que temos tido avanços rumo à igualdade racial, mas a realidade está longe de ser a ideal: “a representatividade ainda é aquém das necessidades concretas de mudanças na sociedade. Estamos no caminho e em permanente construção”.
Marilda, por sua vez, destaca as dificuldades que ainda estão presentes em nosso contexto e reforça a importância das ações afirmativas como ferramentas para uma mudança. “Ainda estamos engatinhando para a descolonização mental, afetiva, social, financeira, intelectual… e sinto uma sociedade buscando respostas para as várias formas de violências sociais. As ações são de extrema importância, é uma tentativa de equiparação de uma parcela da relação.”
A importância da troca de saberes negros
O evento promovido pela Fadepe, em parceria com o Critt e a DIAAF, mostrou toda a relevância da troca de saberes e experiências. Marilda Simeão enfatizou que “as trocas são de extrema importância, nos leva a refletir sobre nossas ações e aquilo que já está consolidado como verdade. Como não existe verdade absoluta, as trocas são enriquecedoras. É um outro olhar sobre”.
“Troca de saberes, roda de conversa, essas coisas baseadas na oralidade, saibam, é uma tradição negra. Nós negros sempre tivemos essa tradição de fazermos troca de saberes a partir das nossas rodas de conversa, das nossas formas de associação. Acho que o evento do último dia 19, além de trazer em si, no seu formato, uma reminiscência do que era a nossa troca de saberes entre os negros,o próprio conteúdo compartilhado proporcionou uma riqueza enorme e uma troca de saberes profunda”, explicou Antônio Carlos.
De acordo com Danielle Teles, o evento foi uma “experiência gratificante”. Para ela, “a única possibilidade de construção de uma sociedade mais justa é a partir do respeito daquilo que surge das pessoas que estiveram alijados e marginalizados. Assim, compartilhar e trocar experiências, saberes e conhecimentos é também processo de cura”.
A construção de um futuro mais igualitário depende da continuidade dessas ações e reflexões. Como apontaram os entrevistados, o desafio não é apenas celebrar, mas promover transformações concretas em todas as esferas da sociedade.